terça-feira, março 06, 2012

Trabalhadores rurais do MST que invadiram o reservatório do Sitio Quixabinha, aguardam por reunião com dirigentes da Chesf.

O Blog de Assis Ramalho visitou o Acampamento e entrevistou o líder do movimento, Vilmar. Ele fala que a mobilização já vinha sendo trabalhada há alguns meses por conta de um acordo não cumprido pela Chesf, Codevasf e equipe do Governo.

Fotos: Assis Ramalho
Domingo (04), cerca de 800 famílias de assentados do MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, invadiram o reservatório da CHESF localizado no Sítio Quixabinha, próximo à divisa dos municípios de Petrolândia e Tacaratu. Liderada por Vilmar, dirigente estadual do MST-PE, a ocupação foi pacífica.

No final da tarde de segunda-feira (05), visitei o acampamento. Conversei com Vilmar, obtendo a seguinte entrevista para o Programa “Acordando com as Notícias”, transmitido pela Rádio 102,7 FM a partir das 5 horas da manhã, e para este Blog.

Assis Ramalho: Vilmar, faça um resumo desse movimento de vocês. Começou quando e o que vocês estão reivindicando?

Vilmar: Essa mobilização já vem sendo trabalhada há alguns meses, por conta de uma acordo não cumprido com a própria CHESF, com a Codevasf e equipes do Governo. Quando foi criado o Assentamento Antônio Conselheiro I e II, em 2004, dentro do acordo seria de o Governo, em conjunto com a Chesf e a Codevasf, esses órgãos, dar 2 hectares de terra irrigada para cada família assentada, o que até então não se cumpriu. De lá para cá já tivemos mais duas negociações e nenhuma se cumpriu. Por isso que essa agora a gente demorou mais tempo para preparar as famílias e viemos com bastante força. Estamos aí, em média, com 800 famílias mobilizadas. Estamos trabalhando uma metodologia em que um grupo vai e o outro vem, para dar apoio, pra garantir que não mais eles (os representantes da Chesf, Codevasf e Governo) venham e “coloquem folhas no nosso nariz” (ditado popular na região, “encher de folhas o nariz de fulano”, significa fazer promessas sem pretender cumpri-las), como fizeram no passado, e a garantia de que vamos negociar e que vamos sair daqui com a vitória, que é levar água para que as famílias possam produzir em seus assentamentos.

Assis Ramalho: Vilmar, essa reivindicação, pelo que a gente percebe, já é de alguns anos. Chegou ao ponto de vocês se cansarem de tanta promessa?

Vilmar: Pois é, das promessas a gente pode se cansar, mas da luta nunca. Então, por isso que hoje nós estamos aqui, preparados pra resistir. Já tem algumas intermediações, mesmo que por celular, por telefone e reunião já prevista. Amanhã a gente vai tentar conversar com o grupo local da Chesf, mais pra discutir os pontos de pauta. Na quinta-feira (08), a gente sentaria com toda a coordenação da Chesf  pra, digamos assim, afinar esses pontos, e na segunda-feira, à tarde, com o presidente da Chesf no Recife, na sede do Recife, e vai estar também conversando conosco alguns representantes do Governo do Estado e o presidente da Codevasf e o superintendente do INCRA/Petrolina, Vitor Hugo Melo.

Assis Ramalho: Quais as lideranças políticas aqui do município (Petrolândia ou Tacaratu) que apareceram (representantes da Chesf, prefeito), quem apareceu aqui?

Vilmar: Até o momento, quem entrou em contato conosco da Chesf, se recusou a vir até este local onde nós estamos pra trabalhar os pontos iniciais (da negociação).

Assis Ramalho: Por que se recusou?

Vilmar: Segundo eles alegaram, aqui não seria um espaço adequado e queriam que nós nos dirigíssemos até (às cidades de) Petrolândia ou Paulo Afonso. Mas há uma necessidade, antes, das famílias de estar presenciando também o momento. A gente sabe que não vai ser possível sentar todo mundo e ouvir todo mundo ao mesmo tempo, mas (há) um espaço reservado para o grupo de negociação, que são os presidentes das Associações, com carro de som pra transmitir a voz, e aí todo mundo, ao mesmo tempo, vai saber do que está se tratando, qual é a proposta. E em relação a quem compareceu, e aí é uma grande figura que já vem (nos) dando suporte, desde quando foi eleito, que é o prefeito (de Petrolândia) Lourival Simões, já esteve aqui hoje (segunda, 05). Veio conversar com a gente, saber como é que estava acontecendo, como é que estava o andamento e também prestar o apoio, enquanto representante do município, inclusive já fez uma ponte com Ranilson Ramos, Secretário do Governo do Estado, da Secretaria de Agricultura, e também ficou de fazer a ponte com o pessoal da Chesf para que eles possam vir aqui, sem nenhum problema.

Assis Ramalho: No caso, os representantes da Chesf ficaram de vir aqui quando mesmo?

Vilmar: A proposta que eles passaram seria na quinta-feira (08), pra conversar. E um segundo momento, que seria no Recife, com o presidente da Chesf.

Assis Ramalho: Vocês não abrem mão deste encontro ser aqui no assentamento de vocês. Ou não?

Vilmar: Não abrimos mão, porque é uma também questão geográfica, eles (precisam) vir aqui, como eles alegam que esta água não é suficiente, mas tem dados que podem ser trabalhados. E também pra visualizar como é que estão localizadas as agrovilas, que elas estão todas aqui, abaixo desse reservatório, com muita água, e ao mesmo tempo que, ao lado, os trabalhadores podem produzir e de outro (lado, outros trabalhadores) ficam impossibilitados de produzir pela questão de não ter água. Então, se estamos lutando pra construir um país democrático, acreditamos que a água é um direito de todos e é vida. Por isso nós estamos aqui resistindo.

Assis Ramalho: Para finalizar, vocês iniciaram esse movimento (de ocupação) ontem (domingo, 04)? Tem data para terminar?

Vilmar: Ontem. Ocupamos ontem. Data para terminar não tem. Só após a negociação, se tivermos resultados positivos, e com certeza vamos ter. Estamos acreditando na luta, acreditando nas parcerias que é possível chegar a um entendimento.

Assis Ramalho: Com certeza, Vilmar, é importante a união de todos, coisa que percebe aqui nesse movimento.

Vilmar: É a união tem sido um elemento fundamental. A gente sempre trabalha com os presidentes das associações, conscientizando para que nunca percam essa mística da unidade. Porque quando o assentado passa a ter a sua terra, sua casa, ele começa a olhar o assentamento (como sendo apenas) minha casa, meu lote, e esquece que muitas lutas ainda virão. Ninguém sozinho consegue criar um assentamento, ocupar uma fazenda ou uma área e reivindicar ela e ter o seu assentamento. Então, assim como foi no início da ocupação, a gente quer que isso continue pra sempre, porque sempre vai haver necessidade de se fazer luta. E por isso que  o povo vai ter que estar sempre unido, pra no momento certo, na hora certa (agir). Claro que respeitando os direitos dos demais também, porque a gente entende que todo mundo tem direito, mas o (direito) de um começa quando o do outro termina.

Assis Ramalho: Uma curiosidade minha. Como é (a organização em) um movimento desses, por exemplo, para o pessoal dormir, ter alimentação? Deve ser algo bem organizado mesmo e (feito) com muita força de vontade.

Vilmar: A necessidade faz com que as pessoas se unam. Tem um ditado que diz que só existem duas coisas no mundo que fazem com que as pessoas se unam: uma delas são as festas comemorativas, quando as pessoas se reúnem para comemorar, e a outra são as dificuldades. Quando você olha pros quatro cantos, que você vê que não consegue sozinho, aí você procura unidade pra resolver. E a questão da alimentação, a gente vem trabalhando. Tanto as próprias famílias vem se ajudando no que podem, com um arroz, um macarrão, e também solicitamos uma contribuição social do município para que pudesse estar nos assessorando com alguns itens que são necessários.

Assis Ramalho: Vilmar, deixo o espaço no meu programa “Acordando com as Notícias”, e também no Blog de Assis Ramalho, para que você deixe sua mensagem para a sociedade, para o Movimento, para as autoridades. Fique à vontade.

Vilmar:  A mensagem que a gente quer deixar é que as pessoas que não conhecem o movimento (MST), o caráter do Movimento, que procure pesquisar um pouco mais sobre a história do Movimento, sobre a história das lutas de classes, por que é que nós lutamos, por que é que nós fazemos luta, qual a importância dos movimentos (sociais) neste país. Porque a gente sabe que a dificuldade que nós temos hoje é a facilidade de uma grande minoria que está por aí, quando a gente fala em relação a projeto de sustentabilidade. A gente vê o agronegócio, são milhões e milhões, é onde o Governo libera sem nenhum problema, simplesmente pra causar danos ao meio ambiente, com aplicação de agrotóxicos e outras coisas mais. A agricultura familiar que deveria ser mais enxergada e mais respeitada, recebe muito pouco, mas são esses, os pequenos, que colocam alimento na mesa de toda a população brasileira. Por isso eu queria deixar uma mensagem de (que é preciso) muito estudo pra ter clareza e conhecimento em relação ao Movimento. Inclusive essa mobilização aqui, ela não é uma mobilização porque a gente não precisa da água só pra tomar banho. A gente entende que a água é o elemento X da vida de toda a Humanidade, dos pássaros, das árvores, e se nós estamos aqui é porque queremos trabalhar. Queremos mostrar pra sociedade que nós não viemos aqui, nós não lutamos pra ocupar terra simplesmente pra ganhar terra, mas pra dizer que somos capazes de produzir alimentos de qualidade pra garantir a soberania alimentar pra todo o povo brasileiro.

Assis Ramalho:  E isso num movimento pacífico (de ocupação).

Vilmar: Líder Estadual do MST
Vilmar: É, estamos pacíficos. Agora, a passividade vai dependendo de cada situação. Mas acreditamos que aqui está sob controle. As associações estão colaborando bastante, os presidentes estão todos empenhados. A companheirada também, de tanto sofrer, já entendeu a importância de a gente manter a unidade, mas também o respeito, que é importante até para que a gente seja bem visto também. Inclusive, aqui nós já estamos acertando para a liberação da água pra companheirada aqui do outro lado, porque (a ocupação)  foi só o início para a gente possa se ajudar nessa questão de cobrar da Chesf, da Codevasf. Mas, se estamos lutando por água, não podemos privar o direito do outro de ter acesso (à água) pra trabalhar.



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