domingo, novembro 25, 2018

Médicos poderão passar por exame de qualificação, diz futuro ministro da Saúde

Futuro ministro da Saúde, Luiz Mandetta defende certificação como a da OAB, além da criação de carreira pública para profissionais atuarem em áreas remotas

Escolhido para comandar o Ministério da Saúde , o deputado federal Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS) quer promover mudanças profundas no setor: exigir certificação dos médicos formados, criar carreira pública para áreas desassistidas, mudando o nome do Mais Médicos para Mais Saúde, e abrir uma linha de crédito para resolver a crise financeira das Santas Casas. Acusado de ter se beneficiado com o pagamento de voos por uma empresa de informática contratada quando era secretário municipal, Mandetta admitiu não ter contabilizado recursos recebidos na campanha de 2010.

Entrevista foi concedida ao jornalista Eduardo Bresciani e Paulo Celso Pereira (O Globo)

O senhor pretende mudar o Revalida ( Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos) para quem se formou fora do Brasil?

Nós queremos mais médicos, mas qualificados. Na graduação, tínhamos 148 faculdades até 2013. Em 2016, fomos para 323. Multiplicamos por três o número de vagas. A sociedade vai perceber que há médicos bem formados e há médicos muito mal formados. A Europa passou a fazer certificação externa, os EUA e o Canadá gostaram da ideia. No mundo inteiro, depois do término da escola, o médico volta em cinco anos para uma recertificação. No Brasil, não existe nada. Vale o seguinte: “Toma o diploma e vá ao mundo. Pode abrir cabeça, pode operar o coração...” Temos hoje um dos modelos de fiscalização do exercício profissional mais frágeis do mundo.

O senhor defende a certificação?
As pessoas falam que se for colocar uma prova para saber se o cara sabe medicina ou não, seria só para o cara de fora. E o médico brasileiro? Eu sou favorável a que o médico brasileiro também faça. Precisa haver no Congresso esse debate. A gente tem que ir para a certificação das faculdades e ter um nível mínimo de formação dos nossos profissionais. Inclusive, se o médico brasileiro é formado nos EUA, na Bolívia, na Argentina ou na Coreia do Sul, ele faz a mesma prova. Eu não tenho por que cobrar conhecimento diferente do médico brasileiro e do de fora.

O governo deve encaminhar isso ao Congresso?

Eu acho que sim. Já passou da hora de a gente ter um marco regulatório.

Como solucionar a situação do Mais Médicos?

Primeiro, é preciso analisar como levar saúde para todos os lugares de um país continental com tantas assimetrias. Em 1988, escrevemos na Constituição: saúde é um direito de todos e dever do Estado. O Estado precisa decidir qual é seu papel. Não acredito que seja pôr médico em Ipanema, Leblon, no Eixo Monumental de Brasília, no centro de Salvador, mas nas áreas de exclusão social absoluta, onde há grandes vazios de assistência. Isso vai ter que partir como uma iniciativa do Executivo, e o presidente Bolsonaro foi claro: na sua gestão, vai fazer a proposta de ter uma carreira para levar a saúde a locais de difícil provimento.

Como seria feito?

A gente tem várias maneiras de fazer essas frentes de interiorização. Eu não gosto do nome do Mais Médicos. Prefiro Mais Saúde. Você negligencia enfermagem e está dizendo que não precisa de um fisioterapeuta, de terapeuta ocupacional, de nutricionista, de psicólogo, de odontólogos, de uma série de profissionais. Você precisa começar pelos essenciais: enfermeiro e médico.

E há dinheiro?

Se você hoje está pagando R$ 14 mil por médico, dando 70% para Cuba, já existe esse gasto na União. Eu acho que o impacto disso está dentro desses 7 bilhões e meio (de reais) que mandamos para fora do país para fazer um programa que não era estruturante.

O senhor acha que, na saúde, falta recurso ou falta gestão?

Acho que faltam os dois, o pior cenário. O recurso é aparentemente insuficiente e há uma capacidade de gestão aparentemente crítica.

O que fazer com Santas Casas, que estão endividadas?

A primeira Santa Casa do Brasil é de 1530. Praticamente em cada cidade do Brasil você tem um pequeno hospital filantrópico ou uma Santa Casa. E, ressalvadas as exceções, as filantrópicas têm uma performance muito superior com recurso público do que o hospital público. Nós vamos discutir com esse setor uma política que possa dar a eles ao mesmo tempo condições de enfrentar os seus problemas de gestão e endividamento crônicos e condições de ter um contrato equilibrado com o sistema público para o atendimento.

Serão recursos separados?

Isso. É preciso romper o ciclo de endividamento. Está na hora de um relacionamento mais maduro. Não só com as Santas Casas, mas também com os hospitais públicos. Você tem unidades públicas que consomem dez vezes mais dinheiro para fazer menos do que uma Santa Casa, na mesma cidade, com os mesmos profissionais.

A Anvisa tem que acelerar os processos?

A velocidade com que as coisas estão acontecendo no mundo é muito grande. Nos Estados Unidos, só no capítulo alimentar, são 14 mil técnicos. A Anvisa tem 20. Eu posso fazer uma validação provisória baseada na avaliação de três agências de primeira linha (de outros países) até que meu grupo de trabalho faça. Precisamos entrar nesse mundo de compartilhamento. O alimento que é feito aqui, os franceses, ingleses e chineses vão comprar. Para remédio, é a mesma coisa.

O Ministério Público diz que uma empresa contratada na sua gestão na secretaria de Saúde de Campo Grande pagou por voos de sua pré-campanha. Houve essa troca de favores?

Eu nunca tinha sido candidato a nada. Eu tinha uma grande amizade com o Leandro, irmão do dono da Amapil (empresa de táxi-aéreo), e ele falou: “Pode usar”. Mas nunca pedi nada. Eu poderia ter voado com pelo menos uns 50 aviões, voei em vários. Teve um que falou: “Pago o piloto e a gasolina”. Outro: “Te empresto o avião”. Isso era algo comum na pré-campanha.

Na campanha, não?

Eu voei alguma coisa, mas muito menos. E foi assim que essa coisa se deu. Nunca teve essa coisa de você me dá isso e desconta daquilo.

O senhor não sabia quem estava pagando?

Não é uma coisa que fosse objeto de que tinha que ter contrato, como em 2014. Eu viajei? Viajei. Deveria ter sido feito? Não sei.

Na campanha teve voo que o senhor declarou?

Alguns. Tem que abrir lá para olhar. Lembro que na campanha de 2010 foi feita uma reunião numa associação médica. Alguém falou: “Gente, para ajudar, vamos passar o chapéu”. Aí ele tira e faz um cheque de “milão”, outro dá “quinhentão”, outro dá “duzentão”. No final, deu R$ 20 mil. Se fosse hoje, era doação fora da lei e blá, blá, blá. Na época, não tinha essa paranoia obsessiva. Eu posso, sim, ter errado. Perfeitamente. O dia em que o presidente me chamou para ser ministro, eu mostrei o inquérito. Ele falou: “Mas você não é réu nem nunca foi denunciado?” Não. Eu disse: “Isso daqui, presidente, pode ser um problema para você e para mim”. É fato: fui até Portugal, voei com a Amapil, muita gente ajudou. Tem um amigo meu que leiloou um tourinho, fez rifa, me deu umas horas de voo, e eu voei. Podia ter sido errado? Podia. Se eu tiver que pagar alguma coisa, não tem problema.

O caixa dois pode atrapalhar sua nomeação?

Acho que não, mas se for algum óbice, a gente ajuda a construir.

Por: O Globo

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