terça-feira, agosto 23, 2016

MPPE participa de curso sobre feminicídio para discussão da violência contra a mulher e atuação do Ministério Público


A violência doméstica contra a mulher e sua manifestação mais extrema, o feminicídio, não acontecem de uma hora para a outra, mas são resultados de uma cultura sexista, que desvaloriza o papel feminino desde a infância e dificulta a quebra de um ciclo de agressões contra as mulheres. Para compreender a dinâmica desse fenômeno, promotores de Justiça, servidores e estagiários do Ministério Público de Pernambuco (MPPE) participaram do II Curso sobre Violência de Gênero contra a Mulher: Combate ao Feminicídio, realizado nessa segunda-feira (22) pela Escola Superior do Ministério Público (ESMP) e pelo Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça Criminal (Caop Criminal).

Abrindo os trabalhos, o coordenador do Caop Criminal, promotor de Justiça Carlos Vitório, destacou que a Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp) delimitou como uma das prioridades para este ano a redução dos crimes de feminicídio. Dessa maneira, serão estabelecidos prazos para que todo o sistema de Justiça atue com o objetivo de garantir que os casos de violência contra a mulher sejam recebidos, que as mulheres sejam protegidas e os agressores, punidos.

Já a coordenadora do Núcleo de Apoio à Mulher Promotora de Justiça Maria Aparecida da Silva Clemente (NAM), promotora de Justiça Maria de Fátima Araújo, apresentou os números dos casos recebidos através do Ligue 180, serviço que recebe denúncias de violência doméstica contra a mulher, e da Secretaria Estadual da Mulher, que compilou os dados de homicídios contra mulheres. “O mês de junho de 2016 foi o pior da série histórica em Pernambuco, com 36 mulheres assassinadas, superando a média, já lamentável, de 20 mortes por mês”, informou.

O primeiro palestrante do evento foi o coordenador do Núcleo de Direitos Humanos do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), promotor de Justiça Thiago Pierobom. Ele explanou, durante a manhã, a dinâmica do feminicídio e apresentou as ferramentas com que o MP pode contar para atuar no enfrentamento à violência doméstica.

De acordo com Pierobom, o passo mais importante para reduzir os casos de feminicídio e violência doméstica é estruturar uma atuação em rede, uma vez que o Ministério Público, o Judiciário e as polícias, sozinhos, não podem resolver o problema. “A Lei Maria da Penha abriu três eixos para atuarmos: na prevenção dos casos, na proteção à vítima e na responsabilização do agressor. Nós não podemos, mesmo com o clamor da sociedade e da mídia, nos limitar à punição dos agressores, porque a violência doméstica é muito complexa”, relatou.

O palestrante defendeu que as mulheres são vítimas preferenciais da violência devido a várias construções históricas que delimitaram o espaço feminino e levaram muitas delas a um quadro de fragilidade social. “As microviolências contra as mulheres são normatizadas na sociedade. Nesse contexto, a Lei Maria da Penha foi um grande avanço, que veio para tentar quebrar uma cultura machista”, acrescentou.

Para Thiago Pierobom, o que o sistema de Justiça deve fazer para tirar as mulheres da situação de vítimas da violência é compreender o ciclo crescente de agressões que caracterizam a violência doméstica – que começa com discussões, passa para agressões verbais, violência psicológica e ameaças, até a concretização da violência física – e implementar um projeto de proteção para as mulheres. Dentre as medidas propostas pelo palestrante estão a avaliação do risco de cada caso atendido; o encaminhamento das vítimas para assistência psicossocial; a criação de um programa para garantir a segurança das mulheres e dos demais entes da família que vivem no ambiente doméstico; a atuação proativa na concessão das medidas protetivas; a articulação da rede de apoio; o encaminhamento dos agressores para acompanhamento psicossocial; e a fiscalização das políticas públicas de enfrentamento à violência.

“Não existe uma solução única, o Estado como um todo deve agir para evitar a escalada da violência. Não adianta, por exemplo, decretar uma medida protetiva e não ter uma atuação efetiva para evitar que o agressor retorne ao lar. Se ele voltar, não é um papel que vai salvar a vida da mulher”, complementou.

Já pela tarde, os promotores de Justiça Dalva Cabral e Edgar Braz abordaram o tema Feminicídio no Tribunal do Júri. Segundo Dalva, o membro do Ministério Público deve estar atento para investigar o histórico de cada caso, a fim de determinar se houve o feminicídio.

“O feminicídio é a consolidação de uma prática continuada de violência doméstica. São crimes que têm um perfil próprio, tanto da vítima quanto do agressor, então o promotor deve ir a fundo a fim de identificar as condutas que permitam a produção de provas para que os jurados condenem o réu por homicídio com a qualificadora do feminicídio”, ressaltou.

Já o promotor Edgar Braz disse que a inclusão do feminicídio no Código Penal, em 2015, trouxe inovações, como o aumento de pena em casos específicos, como o homicídio quando a mulher está grávida ou no puerpério (até três meses após o parto), quando a vítima é menor de 14 ou maior de 60 anos ou quando é praticado na presença de ascendentes e descendentes da vítima.

“Um aumento de pena da ordem de um terço até a metade é sim uma mudança drástica, e só o fato de ter havido um debate sobre o assunto graças ao fato novo, que é o feminicídio, já deve ser comemorado”, concluiu Edgar Braz.

MPPE

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