segunda-feira, setembro 30, 2013

Servidores da Assembleia Legislativa de Alagoas recebem Bolsa-Família; são mais de100 mil depósitos suspeitos, diz ''Fantástico''

Desvios podem passar de R$ 70 milhões.

Funcionários da Assembleia Legislativa de Alagoas (ALE) receberam o Bolsa-Família, benefício do governo federal para pessoas pobres com renda de até R$ 70 por mês. A denúncia foi ao ar na noite deste domingo (29), no programa Fantástico, da Rede Globo. A reportagem deu destaque também a mais de 100 mil depósitos suspeitos feitos nas contas de funcionários e que estão sendo investigados pelo Ministério Público Estadual.



Seriam 11 servidores ao todo. Um deles é Joana d’Arc da Silva. Além do benefício, depósitos suspeitos foram realizados nas contas dela, do marido e da filha, todos servidores do presidente da ALE, Fernando Toledo (PSDB). Nas contas bancárias deles, apareceram 277 depósitos suspeitos em um ano e meio, entre janeiro de 2012 e julho de 2013. No total, mais de R$ 1,6 milhão pago pela Assembleia.

“Os vestígios são claros. Quem praticou essas ilicitudes não teve a preocupação em apagar os seus rastros”, disse o procurador geral da Justiça de Alagoas, Sérgio Jucá, em entrevista ao repórter Maurício Ferraz.

Joana é assessora administrativa especial. O marido dela, Gildo, e a filha do casal, Iris, são secretários parlamentares. O salário oficial de cada um é de cerca de R$ 12 mil, mas, só no mês de outubro de 2012, por exemplo, R$ 51,5 mil foram depositados só na conta de Gildo.

Segundo o advogado da família, Luiz Gustavo Gonçalves, não há irregularidade nos salários. “Foram quantias que não foram depositadas no tempo correto na conta. Foram feitos requerimentos administrativos para poder solucionar essa situação”, afirma.

Sobre o Bolsa-Família pago à Joana, o advogado garante: “Tudo que for apurado que foi recebido de forma ilegal vai ser devolvido”.

Mas este não seria o único caso de pagamento do benefício a um funcionário da ALE. De acordo com a reportagem, outros dez servidores também ganham o Bolsa-Família. Funcionários que trabalham no local há 20, 30 anos, dizem não conhecer essas pessoas que recebem o benefício.

A equipe de reportagem do Fantástico foi aos endereços que constam no cadastro do programa. Marcelo da Silva moraria em um bairro pobre de Maceió. Mas, segundo a mãe, ele vive no interior. Documentos obtidos pela reportagem dão conta de que ele teria recebido R$ 424 mil da ALE, além do Bolsa-Família. “Isso não existe”, garante a mãe de Silva.

Em outro bairro mora Maxwell Santos. Na conta dele foram parar mais de R$ 626 mil da Assembleia. A mulher de Maxwell confirma que o dinheiro entrou na conta dele. Por telefone, o funcionário avisa que não vai dar entrevista.

O Fantástico foi a outro endereço, também na periferia. No local mora Maria Silvania Gama Macedo. Ela apareceu, mas ao ser questionada que teria entrado na conta dela R$ 687 mil e ela ainda recebe Bolsa-Família, Maria Silvania se escondeu. Segundo a Assembleia, ela foi demitida este mês.

O Ministério do Desenvolvimento Social informou que vai pedir uma reavaliação financeira das famílias mostradas na reportagem. O pagamento pode ser suspenso.

O Fantástico teve acesso à folha de pagamento dos últimos quatro anos da ALE. Há indícios de várias irregularidades, como ex-deputados que, mesmo depois de morrerem, receberam salários durante três meses. Além de funcionários vivos que teriam recebido duas, três vezes mais que o salário oficial e os fantasmas: funcionários que recebem, mas não trabalham.

De acordo com a reportagem, em quatro anos, cerca de 108 mil depósitos foram realizados nas contas de funcionários da ALE. Desvios que podem passar dos R$ 70 milhões.

“Existe, na Assembleia Legislativa, um bando de parasitas, servidores que não sabem nem onde fica a Assembleia Legislativa, que nunca deram um dia de trabalho”, afirma Jucá. Durante a semana em que a equipe de reportagem do Fantástico foi várias vezes à ALE, nenhum pediatra, neurologista, psicólogo ou dentista foi encontrado. Segundo o MP, 23 profissionais de diversas especialidades deveriam trabalhar no ambulatório.

“Esses médicos não comparecem. Esse é um fato notório em Alagoas”, destaca o procurador.

Em 2013, a Assembleia vai receber R$ 143 milhões do governo do estado. Nas folhas de pagamento obtidas pelo Fantástico, existem mais de 1.500 funcionários. Três vereadores de Maceió também receberam salários da Assembleia. Mas funcionários dizem que eles não aparecem para trabalhar.

Antonio Holanda Costa, que assumiu o mandato este ano, é um deles. Tem um salário de R$ 15 mil na Câmara. Já na Assembleia, entre janeiro e agosto passado, recebeu um total de R$ 18 mil, como secretário parlamentar.

“Ele pode acumular os vencimentos, desde que exista compatibilidade de horários. Não havendo compatibilidade de horários, ele deve optar por um ou outro. Dois cargos, não. Isso fere a Constituição”, explica Adib Kassouf Saad, presidente do comitê de direito administrativo da OAB.

A equipe de reportagem do Fantástico foi à Câmara de Maceió procurar por Antonio Holanda Costa, que foi demitido da Assembleia em setembro, mas ele não quis dar entrevista.

O Ministério Público investiga se os funcionários ficaram com todo o dinheiro depositado de maneira suspeita, ou se assessores e deputados também receberam alguma parcela destes depósitos. “Eu asseguro ao povo de Alagoas que ninguém ficará impune”, disse Jucá à reportagem.

No cargo há cinco anos, o presidente da Assembleia diz que houve um erro administrativo nos depósitos. “Já foram detectadas essas informações no momento em que foram vistos os lançamentos fracionários nos extratos bancários, e as providências já foram tomadas. Mas não quer dizer que haja nenhuma ilegalidade nem tenha ultrapassado os limites constitucionais”, garante Fernando Toledo.

Depois da equipe de reportagem insistir, o deputado disse: “Se houver alguma irregularidade, a Assembleia vai cobrar para que isso seja devolvido”.

Biblioteca
Outra irregularidade veiculada pelo Fantástico deste domingo foi sobre a biblioteca da Assembleia. No papel, ela recebeu R$ 1 milhão. Só que não tem uma estante ou um livro sequer. “Não há esse recurso para a biblioteca. Houve um redirecionamento desse recurso para recursos humanos. Esse dinheiro foi usado para pagar pessoal”, diz Toledo.

A Controladoria-Geral da União vai ajudar nas investigações para descobrir o que está acontecendo com o dinheiro da Assembleia Legislativa de Alagoas.

Globo.Com

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