quinta-feira, junho 19, 2025

Documentos produzidos pela 'Abin paralela' foram usados em live de Bolsonaro com ataques ao sistema eleitoral, aponta PF

Jair Bolsonaro (PL) fazia lives semanais nas redes sociais
Imagem: Reprodução

Por Márcio Falcão, Redação g1


Documentos produzidos clandestinamente pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) foram usados como base para a live feita por Jair Bolsonaro (PL) em 4 de agosto de 2021, na qual o então presidente atacou o sistema eleitoral brasileiro e defendeu a adoção do voto impresso, de acordo com inquérito da Polícia Federal divulgado nesta terça-feira (18).

O inquérito aponta que o material foi criado por servidores públicos com fins políticos, sem registro formal ou vinculação a atividades legítimas de inteligência. As informações contra as urnas, segundo a PF, não tiveram "embasamento técnico nem respaldo legal".

Segundo o relatório entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF), os arquivos analisados foram elaborados dentro da chamada "Abin paralela", com a participação direta do então diretor da agência, Alexandre Ramagem. O ex-presidente Bolsonaro era o "principal destinatário" do resultados das ações da agência.

Entre os documentos usados na live de agosto de 2021, a PF destaca o arquivo "Presidente TSE informa.docx", criado por Ramagem em 27 de julho de 2021. O texto trazia uma sugestão de narrativa a ser adotada publicamente por Bolsonaro sobre a suposta vulnerabilidade das urnas eletrônicas.

"A prova da vulnerabilidade já foi feita em 2018. Resta somente trazê-la novamente e constantemente", diz um trecho do documento citado pela PF criado por Ramagem.

Esse trecho, segundo os peritos, foi reproduzido, quase que literalmente, na live de 4 de agosto de 2021, realizada por Bolsonaro.

A PF descobriu que:

O documento foi criado com o e-mail pessoal de Ramagem e nunca foi registrado nos sistemas oficiais da Abin;

O arquivo 'Presidente TSE informa.docx' foi criado e modificado no período de 10/07/2021 até 27/07/2021;

O arquivo foi localizado nos dispositivos eletrônicos de Ramagem;

Não há qualquer ordem de inteligência vinculada a ele;

O conteúdo, segundo a PF, não possuía qualquer lastro técnico ou comprovação, e que não foi objeto de nenhuma ação legítima de inteligência, tratando-se de um insumo político;

Foi salvo de forma isolada, em ambiente fora do fluxo documental da agência.

A investigação aponta que esse material foi preparado "fora de qualquer sistema de controle ou supervisão formal" da Abin e "teve aplicação direta na live realizada pelo então Presidente da República".

O relatório afirma que os documentos foram compartilhados por fora da Abin, por meio do WhatsApp, com interlocutores ligados ao vereador Carlos Bolsonaro, filho do ex-presidente. Parte do conteúdo foi usado na transmissão feita por Jair Bolsonaro em seus canais oficiais.

A live também apresentou trechos do Inquérito Policial nº 1361/2018, da própria PF, que estava sob sigilo. A investigação aponta que a Abin havia requisitado esse inquérito por meio de um pedido de inteligência, e que os dados foram reaproveitados na transmissão presidencial sem qualquer autorização judicial.

A PF conclui que os documentos não faziam parte de nenhuma missão oficial da Abin e, sim, de uma estrutura paralela montada dentro da agência para atender aos interesses políticos do então governo.

"O conteúdo foi preparado sem inserção nos sistemas de registro oficial da Abin, com circulação direcionada e uso em ações públicas e políticas coordenadas", diz o relatório.

Os investigadores destacam, ainda, que os documentos foram elaborados com o objetivo de alimentar "ações públicas voltadas à campanha de desinformação sobre o sistema eleitoral, fora do escopo legal da atividade de inteligência".

Por Márcio Falcão, Redação g1

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