sábado, outubro 04, 2014

A guerra dos memes, artigo de Montserrat Martins


Nunca antes na história deste país os memes foram tão usados numa eleição presidencial. Ainda não sabemos (quando foi escrita essa coluna) quem vencerá o pleito, mas podemos dizer com certeza que os memes foram os grandes vitoriosos dessa campanha. Vale a pena entender daquilo que se tornou de extrema importância na decisão dos rumos do nosso país. Ah, sim, o que são memes, exatamente?

É aquele tipo de ideia simples – independente de ser verdadeira ou falsa – que se reproduz com grande velocidade se difunde massivamente, os chamados “virais” da internet. Quem “descobriu”, batizou e conceitou os “memes” foi o neo-darwinista Richard Dawkins, no seu livro “O Gene Egoísta”, em 1976. A teoria de Darwin demonstrava como o gene é o menor fragmento biológico com tendência à autorreprodução, que é mais rápida quanto mais simples o organismo – como o vírus.

Por analogia com a tendência inata dos genes a se multiplicarem, Darwin chegou a iniciar algumas observações sobre se isso ocorreria não só na biologia mas também no terreno cultural. Dawkins aprofundou essa indagação de seu inspirador e percebeu que o equivalente ao menor fragmento biológico que se reproduz (o gene), há o menor fragmento de memória que também tende a se reproduzir – que chamou de “meme”, como um diminutivo de memória e por analogia com o gene.

Para se tornar “meme”, uma ideia deve ser absolutamente simples – quanto mais simples for, mais facilmente irá se reproduzir. Pode ser uma simples palavra, “bipolar” por exemplo está na moda e virou um apelido comum que as pessoas dão umas às outras, seja falando sério ou brincando. Frases que viram chavões, bordões, quanto mais simples e atrativa, mais poderosas são enquanto memes: “Pior do que tá não fica” gerou milhões de votos, a maioria como forma de brincadeira.

Sempre houve memes nas eleições e do dia a dia, tanto para fortalecer os próprios partidos, quanto para desmoralizar os adversários. Nos últimos 20 anos se desenvolveu a guerra de memes PT x PSDB que se acusam reciprocamente de “privataria tucana” e de “petralhas”. A imagem dos tucanos como Aécio foi associada a um playboy que privatizaria tudo e a da Dilma como uma terrorista cúmplice de uma quadrilha. A foto de óculos da Dilma guerrilheira circula há anos nas redes sociais com a pecha de assassina. O que os marqueteiros fazem com isso? O genial marqueteiro da Dilma a transformou em “coração valente” usando a mesma foto com a qual ela foi atacada durante anos, “viralizando” a imagem associada ao novo conceito (valente), como um Che Guevara tupiniquim. Aécio é vendido como “competente, capaz de atrair investimentos” como o bom de seu trânsito empresarial.

Marina que havia sido poupada em 2010 – porque não indo ao segundo turno era um apoio desejado – entrou dessa vez na guerra de memes tachada de “metamorfose ambulante” por troca de partido e de item do programa de governo. Para a criação de memes, pouco importa se realmente Malafaia teve algo a ver com a mudança ou se foi como ela explicou (que faltara a revisão e mediação em partes do programa, erro percebido no dia seguinte), o que importa é a ideia de mais fácil reprodução. Seria o equivalente a criar um meme associando Dilma a Edir Macedo. Também foi o que ocorreu nos ataques a Neca, por ser herdeira de banco, e poderia ter sido feito o mesmo associando Dilma a Eike, seu amigo bilionário. Memes não tem nada a ver nem com análises dos problemas nem com projetos para o país. São bordões fáceis apenas, usados nesta eleição como numa guerra.

Montserrat Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é Psiquiatra.

Fonte: Ecodebate

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