Promulgadas ontem (12), as novas regras da Previdência já estão em vigor. Algumas mudanças, no entanto, só passarão a valer daqui a 90 dias, como é o caso das novas alíquotas de contribuição previdenciária, que aumentarão progressivamente em proporção ao salário.
Paulo Bacelar, sócio da Bacelar e Nousianen Advogados Associados e coordenador do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) no Ceará, explica que, por se tratar de questão tributária, essas mudanças não podem entrar em vigor imediatamente.
"As novas alíquotas e formas de contribuição do trabalhador ficarão para 2020. Mas as regras de transição e de idade mínima para quem começar a contribuir a partir de agora são automáticas", explica.
Atendimento
O grande volume de regras e a demora da atualização do sistema do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deve provocar certa turbulência nas agências devido ao número de pessoas que ainda têm dúvidas sobre a aposentadoria. Bacelar revela que, frustrando o primeiro impulso dos trabalhadores de buscar as agências do INSS para tirar dúvidas, praticamente não haverá atendimento presencial.
"Nós que trabalhamos com Direito Previdenciário fazemos o atendimento ao cliente, vemos que muitos deles já vieram de tentativas de idas às agências do INSS. As agências também estão passando por uma modificação grande, muitos servidores se aposentaram em massa de janeiro até hoje. Há agências que passaram a ter o atendimento online através do INSS Digital, então praticamente atendimento em agência não está sendo feito, inclusive estão fechando às 13h", alerta.
Ele demonstra preocupação com essa falta de canais de esclarecimento e atendimento ao trabalhador. "A população sofrida com a reforma já vai passar por uma situação de embate com o próprio poder público, que não tem servidores disponíveis para explicar os direitos deles que foram alterados. É lamentável isso que está acontecendo. Daí a importância de se ter profissionais preparados, qualificados para entender a reforma e poder passar as informações corretas", ressalta.
Bacelar ainda aponta que, de tão complexas, as novas regras da Previdência geram dúvidas até para quem trabalha no ramo. "Entre os próprios professores do IBDP existem dúvidas de como essas leis estão sendo interpretadas. Por exemplo, em relação ao cálculo dos benefícios nas regras de transição em que ainda serão utilizados o fator previdenciário. Vamos esperar a normativa do próprio INSS", acrescenta.
"Imagina um trabalhador tentando sozinho a própria aposentadoria. Ele vai ter muita dificuldade e talvez se aposente com valores menores do que teria direito".
Atualização
O coordenador do IBDP no Estado revela que o sistema do INSS que concede os benefícios deve demorar alguns meses para ser atualizado às novas regras. "Eu fui servidor do INSS por 14 anos e sempre vi, na minha realidade, que quando muda uma lei, o sistema fica de seis a oito meses para cumprir aquela lei. Isso aconteceu com a lei complementar 142 de 2013, relativa a aposentadoria dos deficientes. O INSS só começou a conceder o benefício entre março e abril de 2014, ficou quase um ano sem o sistema para conceder", alerta.
Tendo como base essa experiência, Bacelar estima que o processo de atualização do sistema do INSS, no caso da reforma, será ainda mais complicado. "Imagina agora que vai ter regra anterior, regra posterior, regra de transição. O sistema com certeza não vai estar adaptado e tenho certeza de que esses benefícios que estão sendo dado entrada agora serão sobrestados, causando uma demora maior ainda na concessão dos benefícios previdenciários. Isso é, pra mim, um grande problema", diz.
De acordo com o coordenador estadual do IBDP, o INSS provavelmente irá emitir um memorando interno orientando os servidores a não concederem qualquer benefício até se completar a atualização do sistema. Os prejudicados deverão ter direito ao retroativo do período entre o requerimento e a concessão.
"Mas imagine uma pessoa que precisa cuidar do seu benefício, dá entrada no salário maternidade e só recebe depois de voltar a trabalhar, mesmo com retroativo. Eu torço para que o INSS já esteja trabalhando nisso, porque é uma preocupação que eu tenho como ex-servidor e como advogado, sabendo que os processos dos meus clientes terão essa dificuldade".
Novos desafios após promulgação
Sem a presença do presidente da República, Jair Bolsonaro, e de ministros do Governo, o Congresso Nacional promulgou, ontem, 12, a reforma da Previdência. Nos bastidores, o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, manifestou satisfação pela promulgação, deixando claro que há outros desafios na sequência.
O membro da equipe econômica do Governo Federal faz referência direta à PEC paralela, a qual deve tratar de temas que ficaram de fora do texto da reforma.
Além disso, a capitalização, um dos objetivos declarados do ministro Paulo Guedes (Economia), também ficou de fora da reforma, da PEC e não há planos declarados de levá-la à votação.
A promulgação foi assinada pelos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre , em sessão solene do Congresso no plenário do Senado.
Na mesa da sessão, estavam apenas parlamentares, entre eles integrantes dos comandos da Câmara e do Senado e líderes do Governo.
Bolsonaro chegou a dizer pela manhã que decidiria se iria à cerimônia. Pouco antes do evento, parlamentares foram informados que o presidente não estaria presente.
Alcolumbre minimizou a ausência de Bolsonaro, citando que, em sessões anteriores de promulgação de emendas constitucionais, não houve a presença do chefe do Executivo.
Alíquotas
A reforma da Previdência cria alíquotas de contribuição progressivas tanto para o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que reúne os segurados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), quanto para o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), dos servidores da União. Hoje, há três percentuais de contribuição para o INSS de acordo com a renda do empregado da iniciativa privada: 8%, 9% e 11% (cálculo sobre todo o salário).
Com as mudança, esses percentuais vão variar de 7,5% a 14%. O cálculo será feito sobre cada faixa de salário. Como a incidência da contribuição será por faixas de renda, é preciso calcular caso a caso para ver quem paga mais ou menos. Por exemplo, a alíquota de contribuição para quem ganha R$ 2 mil é 9% - ou R$ 180. Com a tributação por faixas, a alíquota efetiva será de 8,25%, equivalente a R$ 165,03. Já quem recebe R$ 2,8 mil vai recolher mais para a Previdência. A alíquota subirá de 9% para 9,32%. A contribuição sobe, neste caso, de R$ 252 para R$ 261,03.
Por Carolina Mesquita
Diário do Nordeste