A Petrobras perdeu R$ 32,4 bilhões em valor de mercado após o presidente Jair Bolsonaro impedir o aumento do diesel previsto para esta sexta-feira (12). Temeroso com uma eventual nova paralisação dos caminhoneiros, Bolsonaro ordenou ao presidente da estatal, Roberto Castello Branco, que revogasse horas depois de a medida ser divulgada, ainda na quinta (11).
A interferência do governo assustou o mercado, que colocou nos preços das ações o receio de que intervenções se tornem a regra, e não a exceção. O reajuste anunciado era de 5,7%.
As ações cederam ao redor 8%. Os papéis preferenciais (mais negociados) recuaram a R$ 25,83, enquanto os ordinários (com direito a voto) fecharam a 29,13. Os recibos de ações da estatal negociados em Nova York tiveram perdas acima de 9%.
É a maior queda percentual da companhia desde 1º de junho de 2018, quando Pedro Parente renunciou ao cargo de presidente da estatal, em meio à pressão para mudança na regra de reajuste dos combustíveis, por pressão do governo.
O tombo da Petrobras levou a Bolsa brasileira de arrasto, apesar do dia positivo no exterior: o Ibovespa, principal índice acionário do país, recuou 1,98%, a 92.875 pontos, no menor nível desde 27 de março, quando a preocupação era a reforma da Previdência.
O giro financeiro foi de R$ 21 bilhões, o que reflete a liquidação que os investidores fizeram após a notícia negativa. A média diária de negociação neste ano ronda os R$ 16 bilhões.
O banco BTG Pactual classificou a intervenção de Bolsonaro na Petrobras como um déjà vu, uma lembrança amarga dos congelamentos de preços de combustíveis da gestão de Dilma Rousseff (PT), que colocaram a companhia em crise financeira.
BTG citou, porém, que a medida pode ser uma forma de conter uma eventual nova paralisação de caminhoneiros.
"Então ficamos com um dilema. Enquanto as consequências de uma nova greve provavelmente seriam muito negativas para a agenda de crescimento do país (incluindo reformas) e inclusive para a Petrobras, a percepção de que a companhia está exposta a influências políticas, mesmo sob uma agenda [governo] liberal, coloca em risco o seu pilar central de processo de redução de riscos", disse o BTG.
Por enquanto, o preço do diesel permanece congelado, o que representa uma perda de R$ 14 milhões por dia a Petrobras. Depois da política de ajustes diários, iniciada pelo governo Michel Temer (MDB) , que culminou na paralisação dos caminhoneiros de 2018, o método de cálculo começou a ser flexibilizado.
Quando Pedro Parente assumiu a empresa, sob Temer, foi implantada a política atual de reajuste de preços. Ela leva em consideração a cotação internacional do petróleo, o câmbio, o custo de importação do combustível e sobre esse valor é aplicada a margem de lucro da empresa. Deixa de ser considerado o custo de produção da Petrobras.
Quando os preços do petróleo cederam, no último trimestre do ano passado, a pressão de caminhoneiros cedeu. Neste começo de ano, porém, eles voltaram a subir e agora rondam os US$ 70 por barril (do tipo brent, a referência internacional). É o mesmo patamar em que estava o combustível quando estourou o protesto dos caminhoneiros do ano passado.
Com a carestia dos combustíveis, os rumores de uma paralisação recomeçaram e não cessaram mesmo após o anúncio de ajustes mais espaçados e de um cartão de abastecimento a preços fixos. A divulgação na tarde de quinta de um reajuste maior que a inflação esquentou os ânimos. Com receio a uma nova greve, Bolsonaro telefonou a Castello Branco e, horas depois, o aumento estava cancelado.
Apesar do tombo nas ações, o mercado tentou buscar justificativas, com medo do impacto de uma nova paralisação de caminhoneiros sobre a já cambaleante economia do país. Nesta sexta, o Itaú cortou a previsão de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) para 1,3%. Não pouparam críticas, porém, à intervenção.
"Está faltando uma mensagem mais enfática de que não vai durar. Uma greve dos caminhoneiros agora deixaria o governo natimorto, o apoio popular iria a zero", afirma Victor Candido, economista-chefe da Guide.
"O modelo de preços tem que ser feito pelo presidente da empresa ou pelo economista-chefe e não pelo o presidente do país. O governo prega que as empresas devem ser independentes mas têm atuação direta do presidente. Isso é militarismo? Mão de ferro?", diz Marco Tulli Siqueira, gestor de operações da Coinvalores.
"Se estas intervenções continuarem, a equipe econômica sai do governo. Conheço alguns membros pessoalmente e sei que eles saem. Não vão jogar a toalha, sabem que não é fácil, mas cristal trincado não canta mais. O Bolsonaro não tem que intervir em preços", acrescentou Siqueira.
Para Carlos de Freitas, economista-chefe da Ativa Investimentos, a interferência do governo deve ser apenas pontual. "É muito mais uma sinalização de curto prazo para os caminhoneiros do que uma mudança na postura do governo. Não acredito que essa interferência abra margem para outras. Foi uma decisão tomada para escolher o cenário menos pior".
Foi a mudança na política de preços para atender caminhoneiros que fez com que Pedro Parente se demitisse, em junho do ano passado.
Além de repetir que não entende de economia, Bolsonaro afirmou nesta sexta que quer ver detalhes de como é calculado o reajuste dos combustíveis e qual o custo de produção da Petrobras.
"Onde é que nós refinamos, a que preço, a que custo, eu quero o custo final", afirmou a jornalistas em evento em Macapá.
Por: Folhapress