Bastou uma fração de euro, 20 centavos de real, para incendiar as ruas do Brasil. Quando as autoridades de São Paulo decidiram, no dia 2 de junho, passar o preço da passagem de ônibus de R$ 3 para R$ 3,20, elas estavam longe de imaginar a onda de protestos que iriam provocar. A revolta social se propagou em poucos dias por todo o país, atingindo agora mais de uma centena de cidades e com a aprovação de três quartos da população.
A reportagem é de Nicolas Bourcier, publicada no jornal francês Le Monde e reproduzida pelo portal Uol, 26-06-2013.
A força simbólica desse aumento aparentemente ínfimo levou mais de 1 milhão de pessoas a protestarem contra a corrupção, o desperdício financeiro provocado pelos grandes eventos esportivos e a má qualidade dos serviços públicos, indignos de uma potência emergente. Reivindicações de todo tipo surgiram espontaneamente, como uma necessidade irreprimível de viver em um Brasil melhor.
É verdade que a soma das transformações operadas nos últimos 20 anos, desde a estabilização da moeda e o fim da inflação, graças ao ex-presidente social democrata Fernando Henrique Cardoso, e as melhorias sociais e a ampliação do mercado interno, impulsionadas por Luiz Inácio Lula da Silva, permitiu que o país vivesse um crescimento econômico forte e aparentemente estável. É verdade que não se morre mais de fome no Nordeste, mesmo em período de seca, e, graças aos programas sociais de Lula e da atual presidente, Dilma Rousseff, os moradores das favelas agora podem comprar eletrodomésticos.
No entanto, o verniz estava brilhante demais. Os 20 centavos vieram lembrar que o transporte coletivo se encontrava em um estado lamentável. Que esse aumento previsto ou já aplicado em todas as cidades do país fazia o gasto com condução de um usuário diário bater em um terço do salário mínimo, em um trajeto que em média inclui dois, ou até três ônibus ou metrôs diferentes.