quinta-feira, novembro 30, 2023

Livro da Cepe resgata a história da presença judaica em Pernambuco

Livro fala da presença judaica em Pernambuco, iniciada nos primeiros anos de colonização do país e que se prolonga aos dias atuais

A presença dos judeus em Pernambuco se entrelaça com a própria história do lugar. Há registros desta relação desde os primeiros anos do ciclo comercial do pau-brasil, no século XVI, até décadas recentes. Diante de um período tão largo, o desafio seria escrever uma obra que retratasse os mais de cinco séculos desta presença. O escritor, economista e membro da Academia Pernambucana de Letras (APL) Jacques Ribemboim encarou o desafio. Por mais de uma década, ele se dedicou ao trabalho, pesquisando em acervos nacionais e estrangeiros. O resultado é a História dos Judeus de Pernambuco, um livro da Cepe Editora, com lançamento marcado para o dia 5 de dezembro na APL, bairro das Graças, no Recife.

Em 608 páginas, a obra reproduz ilustrações, mapas, fotografias, selos e documentos de diversas épocas, e traz, principalmente, histórias de homens e mulheres que cruzaram o Atlântico em busca de uma vida nova. A maioria deles enfrentou o mar para fugir da perseguição religiosa na Europa. No Brasil, Pernambuco foi um dos destinos procurados, mas não o único. Ao se referir a Pernambuco, o autor enfatiza que este não se limita “a um território, muito menos ao do atual estado, mas a uma espécie de Pernambuco conceitual”.

De acordo com Ribemboim, o Pernambuco conceitual incluiria aspectos históricos, culturais, etnográficos “e que talvez pudesse ser geograficamente inserido em um Nordeste Setentrional”, compreendido de Alagoas ao Ceará, com trechos de Sergipe e do Maranhão.

O conceito do que venha a ser judeu também é amplo. “Não está relacionado a uma etnia específica, até porque os judeus do Brasil provêm de grupos bastante diversos, embora no período colonial haja prevalecido o padrão sefardita, de origem hispano-portuguesa”, pontua. Ribemboim afirma ainda que por “judeus” deve-se entender os “judeus e cristãos-novos, incluindo alguns de seus descendentes”. Os cristãos-novos, por sua vez, são os judeus convertidos, à força ou por vontade própria, ao cristianismo.

Para contar a História dos Judeus de Pernambuco, o autor optou por estruturá-la em ciclos. Ao todo, seis. O primeiro é o Ciclo da madeira judaica (1502-1535), quando prevalece a exploração do pau-brasil. Depois vem o Criptojudaísmo olindense (1535-1630), período em que a prática religiosa se dava secretamente em virtude das perseguições, o Judaísmo holandês (1630 e 1654), com a vinda de sefarditas holandeses, o Hiato do Judaísmo (1654-1910), no qual o exercício comunitário da religião se restringiu a núcleos paraibanos, o Judaísmo contemporâneo (1910-2000), marcado pela chegada dos imigrantes da Europa Oriental. Por fim, desde 2000, as Novas Tendências (desde 2000), com o judaísmo reformista, a presença das mulheres na liturgia religiosa e o fortalecimento do marranismo.

Ao analisar a cronologia, Ribemboim fala em dois apogeus da presença judaica em Pernambuco. O primeiro ocorreu durante o Judaísmo holandês e o segundo no Judaísmo contemporâneo. Quanto ao primeiro, o autor relata que a expulsão dos holandeses, em 1854, levou os judeus e cristãos-novos que decidiram permanecer no Brasil a se embrenhar pouco a pouco no interior nordestino. Para sobreviver, montaram pequenos negócios, criaram gado e procuraram se manter distante da Inquisição. “É desses cristãos-novos que descendem numerosas famílias tradicionais pernambucanas, paraibanas, alagoanas, potiguares, sergipanas, cearenses, piauienses, gente espalhada por todo o Nordeste”, conclui.

Ainda sobre as heranças advindas dos judeus, o autor ressalta que os primeiros israelitas a desembarcarem em Pernambuco, procedentes da Península Ibérica, “eram morenos claros, bem diferentes do estereótipo agalegado que muitas vezes lhes é atribuído no Brasil de hoje, em resposta a uma imigração mais recente, de asquenazes leste-europeus, vindos de regiões onde subgrupos semitas de fato se apresentam louros ou de olhos azuis, em decorrência da miscigenação com povos locais”.

Para chegar à estrutura final do livro, Ribemboim fez uma pesquisa pormenorizada sobre o assunto. Foram quase 220 livros, capítulos de livros, artigos científicos, artigos e entrevistas publicados em jornais e revistas, além de cerca de 200 fotografias e reproduções de mapas, quadros, gravuras, selos, páginas de livros e documentos. Outro dado que indica a extensão da obra é o índice onomástico, que tem quase 1.600 nomes de pessoas, famílias e autores catalogados. A título de curiosidade, Branca Dias e Maurício de Nassau são os personagens mais citados na obra. Ela, 41 vezes. Ele, 33.

TRECHOS DO LIVRO

“Em um ambiente relativamente amistoso, com o donatário empenhado em povoar sua capitania, a população cristã-nova aumentaria rapidamente e Olinda passa a abrigar a primeira comunidade judaica das Américas. Todavia, sob a vigilância da Inquisição, os cristãos-novos haveriam de praticar o judaísmo de forma discreta ou oculta. É o período de criptojudaísmo olindense, entre 1535 e 1630, encerrado com a invasão holandesa.” (p.13)

“Na fuga de 1492, ou mesmo antes, os judeus procuram Portugal. Na verdade, o país fora abrigo para os israelitas durante séculos e possuía comunidades e sinagogas espalhadas em dezenas de vilas e cidades. Em princípio, os imigrantes eram bem recebidos. O rei e a aristocracia se animavam com a chegada das famílias, trazendo conhecimentos e capacidade empreendedora. Alguns dos profissionais que chegavam a Portugal ingressariam no setor náutico, calhando com os planos de expansão comercial do país.” (p.51)

“Nunca é de menos lembrar que por mais de 50 anos as atividades comunitárias israelitas estiveram sempre concentradas no “triângulo” da Boa Vista, cujos vértices eram o clube, o colégio e a sinagoga. Foi nesse bairro em que a comunidade judaica do Recife atingiu seu apogeu do século XX.” (p.462)

“No Nordeste brasileiro, um movimento de retorno às raízes mosaicas ganha força, semelhante ao caso português. Iniciado nos anos 1980 e chamado genericamente de “marranismo”, é da mais alta importância para uma visão prospectiva do judaísmo na região. O termo “marrano” foi adotando com pujança, muito distante da conotação pejorativa que possuía na Espanha inquisitorial. De certa forma, a autodefinição como marrano constitui um emblema de resistência religiosa, cultural e histórica. Mais recentemente, os judeus marranos também passaram a ser conhecidos como bnei anussim, que pode ser traduzido como “filhos dos convertidos forçados”. (p.548)

SERVIÇO
Lançamento do livro História dos Judeus de Pernambuco, de Jacques Ribemboim (Cepe Editora)
Quando: 05.12.2023
Horário: 19h
Onde: Academia Pernambucana de Letras (APL), Avenida Rui Barbosa, 1596, Graças, Recife
Preço: R$ 90 (preço promocional de lançamento), R$ 110 (preço pós-lançamento)

CEPE

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