Abraão Lincoln Ferreira da Cruz, presidente da CBPA, escoltado pela Polícia do Senado após receber voz de prisão. Imagem: Carlos Moura/Agência Senado.
As fraudes no seguro-defeso, benefício pago pelo governo federal a pescadores artesanais, cresceram com a omissão do INSS, mostra um levantamento do UOL.
órgão permite que entidades investigadas por desvios e falsificações continuem inscrevendo milhares de supostos pescadores no seguro.
São as entidades com acordos de cooperação com o INSS —e não pessoas físicas— as principais responsáveis por inscrever pescadores no seguro, de acordo com informações obtidas pelo UOL via LAI (Lei de Acesso à Informação).
Por isso, a relação das entidades de pesca com o INSS, que já estava na mira da investigação da Polícia Federal no caso dos aposentados, também está sob suspeita no caso do defeso.
Em fevereiro de 2022, a Polícia Federal apontou em uma investigação no Pará que dirigentes de entidades estavam inflando os números, desviando recursos públicos e coagindo trabalhadores a darem parte de seu benefício.
Dois anos depois, em 2024, o INSS permitiu que as mesmas entidades investigadas por fraudes inscrevessem pelo menos 135 mil beneficiários no estado para receber o seguro.
Dados obtidos pelo UOL mostram que, de 2020 a 2025, o INSS assinou acordos com 705 entidades de pesca em todo o país. Nesse período, o número de beneficiários do seguro-defeso chegou a um volume muito maior do que se estima haver pescadores.
Segundo esse cálculo, apenas em 2024, o prejuízo provocado pelas fraudes pode chegar a até R$ 4 bilhões, dois terços dos R$ 5,9 bilhões pagos.
No início de outubro, o Ministério da Pesca e Aquicultura anunciou o cancelamento de 131 mil registros de "pescadores fantasmas". Cerca de 100 mil estavam no Maranhão, estado onde as inscrições dispararam nos últimos anos.
As colônias de pescadores, em nível municipal, têm acordo com federações estaduais que, por sua vez, são coligadas em uma confederação nacional. A maior, hoje, é a CBPA (Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura).
A CBPA foi criada em 2020 por Abraão Lincoln Ferreira, um dos principais sindicalistas da pesca, para contornar uma decisão judicial que o proibiu de assumir um cargo no Piauí enquanto respondia a ações criminais.
Ligado à Força Sindical, Abraão também é investigado pela Polícia Federal pela suspeita de fraudes nos descontos associativos de aposentados por parte da CBPA.
Edson Akio Yamada, então diretor de benefícios, reconsiderou a decisão e permitiu que o acordo fosse celebrado em novembro de 2022. Yamada é investigado pela PF, suspeito de participação nas fraudes nos descontos através desse e outros ACTs.
Na CBPA, Abrãao Lincoln e Juscelino do Peixe (Solidariedade) —integrante da confederação, aliado do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB) e ex-superintendente federal da Pesca em seu estado— também sofreram buscas.
O pagamento do seguro-defeso bateu recorde de R$ 5,9 bilhões em 2024, e está sob investigação da CGU (Controladoria-Geral da União) por suspeita de fraudes e desvios.
Segundo o governo, entidades são suspeitas de coagir trabalhadores a entregar parte do benefício e de inscrever falsos pescadores para ganhar o seguro, de um salário mínimo por até cinco meses.
Em resposta ao UOL, o INSS afirmou que, mesmo com o acordo, é preciso obter a autorização assinada do beneficiário do seguro-defeso para a inscrição.
"É necessário obter autorização expressa do usuário, por meio de Termo de Representação e Autorização de Acesso às Informações Previdenciárias, com indicação específica do requerimento a ser protocolado", disse a autarquia.
Sobre os acordos, afirmou que "têm o objetivo de ampliar o acesso aos benefícios e serviços previdenciários, tais como o seguro-desemprego do pescador artesanal".
OAB no topo do ranking
Os acordos do INSS com a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) também estão na mira das autoridades, já que permitem que qualquer advogado solicite a inscrição no defeso.
No ano passado, advogados de seccionais da OAB em diferentes estados inscreveram 103 mil pessoas no seguro. Quase todas as solicitações vieram do Maranhão, Piauí e Pará, estados em que estão concretadas as fraudes, segundo fontes ligadas às investigações.
A PF e a CGU encontraram situações em que advogados oferecem para inscrever qualquer pessoa no defeso, seja ela ou não pescador, para ficar com uma parte do dinheiro.
Procurada, a Ordem dos Advogados do Brasil não respondeu.
Por Natália Portinari - Colunista do UOL
Reportagem
Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.
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