Presa na Itália, Carla Zambelli participa remotamente de reunião da CCJ da Câmara que discute a sua cassação — Foto: Kevin Lima/g1
Plenário da Câmara manteve a parlamentar no cargo apesar de sentença da Suprema Corte. Condenada a dez anos de reclusão, deputada está presa na Itália.O plenário da Câmara dos Deputados decidiu nesta quarta-feira (10) rejeitar a cassação do mandato parlamentar de Carla Zambelli (PL-SP).
Foram 227 votos a favor, 170 contrários e 10 abstenções – seriam necessários 257 votos para a cassação.
A cassação seria uma consequência da condenação da deputada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por ter comandado uma invasão a sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Os deputados entenderam, no entanto, que a deputada poderia permanecer no cargo. A situação se assemelha à ocorrida com o ex-deputado federal Natan Donadon, em 2013, que foi condenado pelo STF mas teve o mandato preservado pelos colegas da Câmara. (entenda mais abaixo)
O resultado contrariou a recomendação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que aprovou por 32 votos a 2 a recomendação de perda do mandato.
Condenação por invasão de sistemas do CNJ
A condenação de Zambelli pela Primeira Turma do STF se deu por unanimidade em maio.
Os ministros acataram os argumentos da Procuradoria-Geral da República (PGR) de que Zambelli atuou em parceria com o hacker Walter Delgatti Neto para inserir documentos falsos na base de dados do CNJ – incluindo um suposto mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes.
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A deputada Carla Zambelli postou foto de encontro com Walter Delgatti — Foto: Reprodução/Twitter
Segundo a PGR, a intenção era "colocar em dúvida a legitimidade da Justiça" e fomentar manifestações contra as instituições republicanas.
Em junho, a decisão foi mantida pela Primeira Turma – também por unanimidade – ao analisar os recursos apresentados pela parlamentar.
Além da prisão, o STF também determinou a perda imediata do mandato de Zambelli. A Constituição prevê a cassação de parlamentares condenados criminalmente e sem possibilidade de recurso.
A parlamentar fugiu para a Itália. Dias depois de ser considerada fugitiva e procurada pela Interpol, Zambelli foi presa nos arredores de Roma. O governo brasileiro pediu a extradição da deputada, que ainda não foi analisada pela justiça italiana.
Impasse Câmara x STF
A decisão dos deputados cria um impasse que envolve a interpretação da Constituição. Por isso, o tema pode voltar a ser discutido pelo STF.
Esse debate pode ocorrer, por exemplo, a partir de uma ação que questione a validade do procedimento adotado pela Câmara ou por meio de pedidos feitos no próprio processo penal contra Carla Zambelli.
O líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh (RJ), disse logo após a votação que o partido vai ingressar com um mandado de segurança no STF para questionar a decisão do plenário.
"A decisão do Supremo é uma decisão muito clara. (...) Não era para ter ido à CCJ, e o presidente Hugo Motta acabou criando um problema para si próprio. Não era para ter ido para o plenário", disse.
A situação de aproxima do precedente criado pelo processo contra o então deputado federal Natan Donadon em 2013. À época, a evolução do tema no Congresso levantou a discussão sobre a perda de mandato de parlamentar alvo de processo penal.
Na ocasião, a Câmara também levou à deliberação do plenário a situação de Donadon, que teve o mandato preservado pelos colegas.
O tema, então, foi novamente parar no Supremo: um mandado de segurança do deputado Carlos Sampaio (PSD-SP) questionou a validade do processo legislativo adotado pelos parlamentares. Relator do caso, o ministro Luís Roberto Barroso suspendeu a decisão da Câmara.
Posteriormente, a Casa cassou o mandato de Donadon, mas por outro caminho: a partir de um procedimento aberto no Conselho de Ética. Em 2019, a pena de Donadon foi extinta por um indulto natalino do ex-presidente Michel Temer
Entenda o que diz a Constituição
A Constituição prevê um conjunto de situações em que um parlamentar pode perder o mandato.
Entre elas, destacam-se duas situações:
▶️quando o político falta a mais de um terço das sessões da Casa Legislativa. Neste caso, a perda é automática, declarada pelo comando da Câmara ou do Senado.
▶️ quando o político é alvo de condenação criminal definitiva. Neste caso, a perda do mandato é decidida pela Câmara ou o Senado, por maioria absoluta.
Quando decidiu pela condenação de Zambelli, a Primeira Turma do STF determinou a perda de mandato de forma automática, ou seja, com uma declaração da Mesa da Câmara.
🔎Por que o colegiado do Supremo segue esta linha? A interpretação envolve o excesso de faltas. A deputada foi condenada a uma pena superior a 120 dias, em regime fechado, a ser cumprido na prisão. Ou seja, ela fica impedida de exercer suas atividades e, inevitavelmente, vai ultrapassar o limite de ausências. Por isso, a Turma entende que a perda de mandato é automática, adotando-se o procedimento da primeira situação.
🔎Qual a posição seguida pela Câmara? Os deputados deram um tratamento diferente ao tema. Seguiram a segunda situação, aplicando a perda de mandato para parlamentar que sofre condenação penal. Ou seja, consideraram que é cabível uma análise do caso pelo plenário da Câmara, rebatendo a tese de que a perda seria automática.
Por Paloma Rodrigues, Fernanda Vivas, Kevin Lima, Vinícius Cassela, g1 — Brasília
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